Vitórias do Brasil Profundo
*DJ Cuco
Foi de encher os olhos d’água a apresentação de Rebeca Andrade em Tóquio, fazendo seu solo no tablado ao som de Baile de Favela do MC João. Em primeiro lugar, essa linda apresentação, que nas palavras da ginasta: "poderia ter melhorado algumas chegadas”, foi incrível o suficiente para lhe garantir uma vaga na final da modalidade. Em segundo, porque a trilha sonora escolhida representa o quão fértil é o solo de onde esse fruto nasceu. Rebeca é uma de sete filhos, criados por uma mãe solo da periferia de Guarulhos, região metropolitana de São Paulo.
“Trazer a cultura do Funk para o outro lado do mundo foi incrível”, disse a atleta. Foi sim! E muito! O orgulho que eu senti vendo o Brasil preto e periférico representado pela pessoa da atleta e a cultura do Funk, num esporte elitizado, disputando medalha olímpica, me fez pensar que nosso país está pronto pra surpreender positivamente, muitas e muitas vezes mais, se forem dadas as devidas oportunidades.
Por sua vez, Rayssa Leal, skatista, 13 anos, natural de Imperatriz, cidade sede da Região Metropolitana do Sudoeste Maranhense, se tornou a atleta brasileira mais jovem a receber uma medalha olímpica. Ela não quer mais ser chamada de “Fadinha”, apelido que ganhou por ter viralizado na internet, ainda aos 7 anos, com um vídeo no qual fazia uma difícil manobra fantasiada de fada. Um adjetivo pronunciado no diminutivo não cabe mais para se referir a essa garota, de sorriso generoso e uma simplicidade encantadora. “A pureza das crianças” que fala, né? Bom, eu sempre fico com ela.
Fazia uns bons meses que eu não sentia tanto orgulho do meu país. As notícias às vezes intoxicam nosso coração. Quando o que você mais vê é intolerância, mentira, ladroagem, pode ficar parecendo que é natural agir dessa forma. Que o dinheiro é um fim que justifica qualquer meio. Eu discordo! Dinheiro é meio, é ferramenta! E é necessário também pra patrocinar atletas que nos façam sentir orgulho de nós mesmos enquanto nação. Sendo assim, bora comemorar estas vitórias do Brasil Profundo que tem outros problemas ali do outro lado da rua já.
*DJ Cuco é rapper, produtor musical, agitador cultural, gestor de projetos culturais e formado em Gestão Pública. Atua há mais de 20 anos na cena da cultura urbana e periférica da Baixada Santista. É proprietário do Estúdio Bom Bando.